Brasil: 500 Anos

Prof. Nílton de Oliveira Cunha .
Universidade Federal de Santa Catarina.
Florianópolis, 8/11/1999

nocunha@mbox1.ufsc.br

O raiar do século XV parecia anunciar o final da “longa noite de trevas” da Idade Média. O promissor comércio de especiarias do Oriente (pimenta, cravo, gengibre, marfim) por meio dos grandes empórios mediterrâneos (Veneza, Gênova, Florença, Milão) passa por aguda crise devido ao monopólio árabe e à pirataria sarracena.

È nesse contexto difícil para os interesses dos países da Europa que desponta a grandeza e descortino de um homem luminar: Infante D. Henrique (1394-1460), o Navegador, filho do rei D. João I. De esmerada formação cultural e clara visão de seu tempo, desde logo compreendeu o relevante significado do horizonte líquido de Portugal, país de pequeno território, debruçado sobre o Atlântico e com um pé no Mar Mediterrâneo. Determinado, decidiu enfrentar o milenar desafio do Mar Tenebroso, obstáculo maior a ser transposto para a descoberta de novas terras, de sabida existência no além-mar.

Então ainda muito jovem, D. Henrique concebeu e realizou (em parte) o mais ambicioso e venturoso plano que a História até aquela época registrara. Ele reuniu, na aldeia de Sagres, expressiva plêiada de homens de conhecimento, expoentes nos campos da cosmografia, astronomia, matemática, geografia, navegação e construção naval (portugueses, espanhóis, italianos, alemães e judeus) e fundou a Escola de Sagres, uma verdadeira Academia Náutica. “Navegar é preciso…”. O dardo telúrico do Infante apontava para terras distantes.

Na Escola de Sagres inventaram a caravela, aperfeiçoaram a nau, aprimoraram as determinações astronômicas e as cartas de marear (antes, de precisão por demais grosseira) e desenvolveram as técnicas de navegação, condições indispensáveis para navegar em alto mar. Ali se formaram pilotos de escol – Cristóvão Colombo, Bartolomeu Dias, Vasco da Gama e muitos outros.

Método, ciência e ousadia se uniam de modo magistral na aventura de realizar, “com engenho e arte”, a epopéia de romper os limites do Velho Mundo. Feito de tamanha magnitude e significação para os destinos da humanidade só viria a repetir-se quinhentos anos depois, considerando a realidade desta época, com o programa de pesquisas espaciais.

Este período áureo da história de Portugal deixa para o mundo o testemunho inequívoco da capacidade do gênero humano para vencer obstáculos que se nos mostram intransponíveis, insuperáveis. Uma forma de pensar grande para melhor compreender as dificuldades. Uma lição aos governantes nacionais e mundiais a mostrar que não se resolvem problemas complexos amesquinhando ou metamorfoseando o seu real significado. A solução de um problema está no próprio problema e não em miraculosas fórmulas ideológicas. E, para achar a verdadeira solução, mister se faz compreender integralmente o processo, observando com atenção unicamente os fatos envolvidos, independente de idiossincrasias pessoais ou coletivas.

Os 500 anos de história de nosso país está a convidar-nos, povo e governantes, para reflexão sobre os acertos pontuais e os demasiados e graves desacertos, estes constituindo o principal fator responsável pelo agravamento dos agudos problemas sociais, humanos e ambientais, ainda carentes de políticas condizentes com sua magnitude.

500 A N OS

“Navegar é preciso!”, bradam os marujos

diante das robustas naus e caravelas,

engenho e arte da flama e gênio lusos

para os heróicos embates das procelas.

Partem eles, homens desassombrados,

desde a “ocidental praia lusitana,

por mares nunca dantes navegados”.

Na vela a cruz de malta soberana.

Punhos fortes no manejo do leme

da esperança da lusa nacionalidade,

enquanto na praia lenço branco freme,

nostálgico e lírico, a dizer saudade.

Viajam serenos, seguros, os navegadores,

nas mãos, como guia, a carta portulana.

Em cada porto vão plantando os pendores

da cultura e da alma da pátria lusitana.

Um certo dia – corria o ano quinhentos -,

escrevera Caminha, era o mês de abril.

Intencional ou por real falta de ventos

Cabral vai ter à costa leste do Brasil.

Empresa de tal grandeza nenhum povo

realizara antes, e com mesma ousadia.

Só após quinhentos anos, no Mundo Novo,

a era espacial iguala em gênio e maestria.